Periodicidade de publicação de poemas

Caros leitores:
Espero que desfrutem na visita a este espaço literário. Este sítio virtual chama-se “Maria Mãe” e tem como página principal os poemas de Maria Helena Amaro.

domingo, 31 de agosto de 2014

Eu sou...


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Eu sou aquela sombra que ficou
duma imagem feita de luz e cor
sou a criança dum apagado amor
sou a lembrança de algo que passou

Eu sou peregrino errante que outrora
partiu em busca dum tudo que era nada
sou entre tantas uma desventurada
que a sorte abandonou pela vida fora

Sou um rasto do que fui, do que sonhei
no mundo vago que alto elevei
e que o destino cruel me derrubou

Sou aquela que pobre, anda à procura
da palácio da paz e da ventura
que um dia na dor arquitetou...

Maria Helena Amaro
Esposende, 23/07/1953

sábado, 30 de agosto de 2014

Sombras


(Ilustração de Maria Helena Amaro) 


Que saudade eu tenho desses dias
que passei, além, junto de ti
dos meus sonhos, das minhas alegrias
que me recordam o sonho que perdi

Que saudade eu sinto ao recordar
a tua imagem, um prodígio de cor,
a minha ilusão, o meu breve sonhar
e o despertar do meu primeiro amor

Que saudade! Que eterna amargura
são os meus dias vividos sem te ver
todos feitos de dor e de loucura! ...

Tu estás longe, eu sei! E o meu sofrer
é maior que nunca, é desventura
é o princípio de vida a perecer...

Maria Helena Amaro 
20/07/1953

quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Primavera



(Ilustração de Maria Helena Amaro)


Hoje houve mais ânsia em cada peito
mais na linda luz da madrugada
mais fantasia em cada hora passada
mais esperança no sonho já desfeito

Tudo sonhar voltar de novo à vida
ser alegre, rir, ser tudo ardente...
Passam sombras que correm velozmente
a fazer parte duma estação perdida...

Tudo teve mais luz, muito mais cor
o sol bafejou com mais calor
tudo viveu momentos de quimera

Houve um concerto junto de cada ninho
e as flores disseram-me baixinho:
Irmãzinha! Chegou a Primavera! 


Maria Helena Amaro
Braga, 10/04/1953


domingo, 24 de agosto de 2014

Outrora fui rainha


(Ilustração de Maria Helena Amaro)


Outrora fui rainha... em meus castelos
feitos de pedrarias, de luar,
de nuvens e de espumas do mar
Eu reinei com os nobres: meus melros...

Outrora fui rainha... O meu reinado
feito de Paz, de Amor e de Prazer
feito de sofrimento e padecer
desfez-se como um sonho de noivado!

Reinei sem mágoa, coberta de riqueza
Tu eras o meu rei, o meu senhor
que cantavas as meus pés minha beleza

Mas o tempo destruiu sem dó, nem dor
o meu castelo  em que a tristeza
ocupou o lugar do nosso amor!

Maria Helena Amaro
7/01/1953

sábado, 23 de agosto de 2014

Desventura


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

No caminho da vida que percorro
neste mundo todo feito de maldade
só encontro dor e futilidade
e vozes tristes a clamar socorro

Socorro! Diz a minha alma angustiada
querendo como tantas de amargura
num mundo cruel de desventura
perseguida sem dó, acorrentada...

Vai-te amargura! Deixa minha alma assim
assim sozinha... Sozinha sem ninguém
deixa-a a chorar tão só, perto de mim...

Deixa-a viver a Esperança que tem
caminhando depressa para o fim
a encontrar os ideais do Bem!


Maria Helena Amaro
2/07/1953

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Dedicatória (1953)


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Porque estás triste? A tua mocidade
toda feita de sonhos e de luar
devia ser somente para amar
e não para chorar uma saudade

Saudade... Sabes tu... O que é saudade?
Esse tão delicioso sofrimento
que nos lembra as horas d'outro tempo
Que nos leva longe da realidade?

Só tem saudade aquele que muito ama
que sente no peito a longa chama
que lhe abrasa a alma de calor

Léte! Tu não sentes na verdade
que quando pensas na tua saudade
pensas também no teu distante amor?



Maria Helena Amaro
7/06/1953 





domingo, 17 de agosto de 2014

A uma estrela


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Vem até mim o perfume inebriante
das violetas discretas, apagadas,
dos cravos dum vermelho gritante

Vem até mim o murmúrio das eiras
das fontes dando água cristalina
das chagas, dos lírios de cor fina
e o perfume das flores de laranjeiras

Andam sonhos perdidos pelo ar
vozes dos ninhos na noite a namorar
e a voz dos sinos em doce Avé Maria

Estrela linda que andas no céu perdida
deixa-me dar-te no meu peito guarida
neste crepúsculo que a noite anuncia!


Maria Helena Amaro
8/03/1953 

sábado, 16 de agosto de 2014

Saudade


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Saudade é o que vai, é o que foge
o que passa por nós sem nos levar
É uma vida antiga a recordar
"saudade é amanhã o dia de hoje..."

É o fumo que se esvai, que se desprende
de nossa vida em sonhos a reflorir
Saudade é o passado a ressurgir
na vida que passa e se defende...

Saudade é viver já sem ter vida
É uma folha dum livro já caída
que nos faz recordar uma novela...

Saudade é o que vivemos ontem
o que o dia de amanhã contém
e o que hoje nos torna a vida bela!

Maria Helena Amaro
9/03/1953


sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Recomeçar


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Se de novo pudesse reviver
as horas que vivi na minha infância
voltar a ser como fui em criança
e começar de novo o meu viver...

Viver de novo os dias que passei
ser pura como os lírios do jardim
ser botão, ser rosa, ser jasmim
ser orvalho, ser tudo que sonhei...

Correr na vida em debandada louca
atrás dum nada que pode ser tudo
viver feliz a vida sem, contudo,
sentir a alma espezinhada e oca...

Mas não posso voltar  ao meu passado
esquecer-me do meu escuro fado
quando a vida se abre à minha frente

Caminho só em busca de algum bem
e o meu sonho é atingir além
e mais além, mais além do presente!

Maria Helena Amaro
5/03/1953


quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Viagem eterna


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Quanto chorei, sei lá, quanto sofri,
desde que foste para não mais voltar
levou-te a morte e eu fiquei a chorar
a vida longa que vivo em vez de ti

Viagem grande... sem um começo ou fim
sem esperança, sem luz e sem regresso
quantas vezes chorando eu te peço
que voltes novamente para mim!...

Fiquei sem nada, pobre de verdades...
Tudo levaste na tua fuga infinita!
Mas eu estou a esperar-te ainda,
construindo regressos de saudade!

Maria Helena Amaro
Esposende, 27/02/1953

domingo, 3 de agosto de 2014

Nudez


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Ajoelhei-me aqui junto ao altar
e meus olhos ficaram-se sem vida
vendo o doce Jesus agonizar
numa cruz de pinho ao Céu erguida

Jesus! Podes ver-me tal qual sou
neste momento não me atrevo a mentir
tu bem sabes, bom Pai, como estou
a ti Senhor, é loucura mentir!

Todo o Bem que me deste já perdi
os meus enfeites há pouco desprezei
eis-me ajoelhada ao pé de ti
pedindo aquela luz que apaguei...

Ó Jesus! Como sou infeliz!
Tem pena da fraqueza do meu ser!
A minha alma era tão feliz
enquanto eras o meu viver!

Maria Helena Amaro
7/02/1953

sábado, 2 de agosto de 2014

Aguarela (1953)


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Vê o saloio que caminha cansado
enxada ao ombro, jaqueta mal talhada
como é feliz empurrando o arado
de sol a sol na territa arrendada!

Quase à tardinha, quando a luz se faz pouca
vai para casa pensando certamente
com um sorriso de doçura, na boca
na família que ama loucamente

Pelo caminho ouvindo os passarinhos
a chilrear ali junto à estrada
ele pensa... pensa nos seus filhinhos
na sua esposa... na casita alindada...

Depois, pertinho do ninho construído
ele recebe demonstrações de amor
o gato... os filhos...um grilito escondido
a companheira... a bênção de Senhor...

Acomodam-se os filhos na lareira
alegres, entretidos, a brincar...
E enquanto a mulher prepara a ceia
ele fica-se sozinho, a meditar...

Rezam depois o terço juntamente
na mesma crença, na mesma devoção
Jesus no Céu abençoa sorridente
a doce paz que há nessa mansão.


Maria Helena Amaro
26/11/1953