Periodicidade de publicação de poemas

Caros leitores:
Espero que desfrutem na visita a este espaço literário. Este sítio virtual chama-se “Maria Mãe” e tem como página principal os poemas de Maria Helena Amaro.

domingo, 26 de julho de 2015

Dia dos Avós - Avós e netos


(Fotografia de António Sequeira)



Porta fechada. Persiana descida.
Silêncio e sombra na grande mansão.
Chama-se a isto serena solidão.
Sem luz e cor no acabar da vida.

À moradia o sol chega tão tarde
Mas vem cheio de risos e projetos.
Saltita alegre nos rostos dos meus netos.
Espanta em mim a mágoa e a saudade.

Abre-se a porta. Sobe-se a persiana.
É tão ameno aquilo que se ama:
- «Ó avó, avó, o que vamos comer?»

Enche-se a sala de risos e de gritos.
Quem tem netos, como eu, assim bonitos.
Não vive só… Não poderá morrer!


Inédito
Maria Helena Amaro

26/07/2015 

sábado, 25 de julho de 2015

Amor


(Fotografia de António Sequeira)

Amor... andam cantando manhã cedo
os teus irmãos, alegres passarinhos...
Cantam para mim centenas de carinhos.
Entre as flores ou sobre o arvoredo...

Amor... andam no céu cantos divinos
Por entre as nuvens de azul coloridas
andam na terra as minhas mãos doridas
a procurar-te por entre os desatinos

Amor... Busco-te louca na curva do além
Estendo as mãos à tua sombra alada
que sonho que se alonga e nunca vem

Amor... trago a alma já cansada
de procurar-te em vão mundo além
E não te encontro... De ti ninguém diz nada!

Maria Helena Amaro
13/06/1957

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Espelho


(Fotografia de António Sequeira)

Trago nos olhos um mundo de ilusão
Nuvens azuis de sonho e de luar
Lago de amor... de estrelas a brilhar...
Um mar imenso, revolto, em turbilhão...

Trago nos olhos mil ilusões ausentes
onde crepitam a dor e a loucura...
Chamas de sonho... d´apertada loucura...
Desejos loucos... promessas veementes...

Trago nos olhos um mundo que é só meu
no meu olhar de cor de escuro céu
Em tempestade, em noites de invernia...

Trago nos olhos o meu sonho de amor
que a ausência coloriu de dor
e que se esvai no nada dia a dia...

Maria Helena Amaro
13/08/1957

domingo, 19 de julho de 2015

Êxtase


(Fotografia de António Sequeira)

Ao imenso lago azul do mar sem fim
os olhos eu lancei...
E as ondas balouçando lentamente
muitas coisas belas me contaram
numa canção dolente...
E eu sonhei e esqueci-me de mim...
Depois... quando acordei
achei-me tão diferente!!!...
Não era eu que o mar refletia
nas ondas azuladas...
Era outra imagem de poesia e vida
onde o Amor quisera
fazer sua morada...
E os meus olhos ficaram cor de águas
E azuis se tornaram lentamente...
Azul o mar... azul o céu...
E azul a cor das minhas mágoas!


Maria Helena Amaro
1957

sábado, 18 de julho de 2015

Outros tempos


(Fotografia de António Sequeira)

Também tive o meu sonho, o meu reinado
suspenso nas alturas da ilusão
Tive uma coroa, num castelo, num brasão
e um manto de quimeras bordado...

Tive nos olhos castelos infinitos
pousados de loucuras e desejos
Tive nos lábios o amargor de beijos
recolhidos de sonhos esquisitos...

Tive do nada todo o mundo a meus pés
Corri-o ardente, em ânsias, lés a lés
Independente dos dias que voavam...

Todo o reinado tem um findar na vida
e o meu acabou numa subida
onde os ideais da vida me esperavam...

Maria Helena Amaro
1957

quarta-feira, 15 de julho de 2015

Rosas vermelhas


(Fotografia de António Sequeira)


Vem comigo, vem! Nasceu a lua
E as estrelas surgem em cardume
Banham-se as tílias em ondas de perfume
Andam as fadas a passear na rua...

A noite é nossa. Vem! Queres recordar?
O sonho é grande... O sonho é desmedido...
No horizonte anda a gritar perdido...
Uma presença estranha anda no ar...

Vem! Tu não ouves? Não sentes?
Os teus gestos parados, indiferentes
são porventura aqueles que sonhara?

O meu sonho morreu! Toda murchei...
Como murcharam os dias que te dei
Rosas vermelhas que na vida beijava...

Maria Helena Amaro
1957 

domingo, 12 de julho de 2015

Quando eu morrer


(Fotografia de António Sequeira)


Quando eu morrer...
Não quero gritos, nem lamentos,
nem velas a arder enchendo os aposentos
de dor e fraca luz...
Nem coroas, nem saudades, nem «bouquets»
Nem água benta colocada a meus pés
com ramos de oliveira...
Nem gritos, nem choros, nem perdões
Nem vultos negros murmurando orações
À volta do meu leito...
Nem sedas, nem rendas, nem brocadas,
nem tapetes negros prateados
debaixo do esquife...
Nem desfiles à volta do caixão
Nem beijos de paz e compaixão
no meu rosto gelado...
Nem flores pousadas sobre mim
sejam cravos, rosas ou jasmim
ou ervas de valetas...

Quando eu morrer...
Não quero do mundo um enterro faustoso
Nem música, nem cortejo moroso
com negras carpideiras...
Nem discursos de carácter sério
à minha roda lá no cemitério
com frases estudadas...
Não quero féretro de madeira dourada
forrado de seda prateada
empoçado em éter...
Nem carro fúnebre coberto de zingalhos
cheirando a befiro (cheiro de alhos...)
Guarnecido a veludo...
Nem quero capela ou mausoléu
jazigo de mármore (que sei eu?)
com estátuas de gesso...
Nem correntes de ferro brazonadas
Nem pedras ricas, trabalhadas
com nome e inscrições...
Quando eu morrer...
Quero uma campa rasa, campa nua
Sem enfeites das montras lá da rua
Na terra negra e fria...
de branco vestida quero ir
Daquele branco que é dia a ressurgir
no amanhã da vida...
Quero crianças a cantar ao redor
hinos ao céu, à vida, ao Amor
em coros divinais...
Coros celestes, do Reino de Jesus
vestidas d'alvo ou do roxo da cruz
Junto do meu cadáver...
semeiem violetas lá na campa
Mas não façam romagens (não sou santa)
nem chorem sobre mim...
Violetas quero eu, das dos pinhais
As pobres, as que não são reais
nem possuem beleza...   
Não digam que sabem que morri
Para vós, mortais, nunca existi 
Apenas sombra fui...
E se as crianças pisarem o meu leito
não quero pragas (isso é feio, mal feito!)
E as crianças são todo o meu amor!
Quando eu morrer...
Asas do céu hão-de ir visitar-me   
E coisas de Deus hão-de cantar-me
E eu hei-de falar-lhes...
E contarei às crianças coisas minhas
histórias de princesas e rainhas
de moiras encantadas...
Quando eu morrer...
Quero estar só com a amiga morte
e dar contas a Deus da minha sorte
do bem, do mal que fiz...
Não chorem, não gritem, por favor!
A morte é branca, negra é a nossa dor
mas o céu é azul...

Quando eu morrer...
Erguida ao Céu quero uma cruz bem forte
Triunfo da vida sobre a morte
no meu leito de pó...
Depois...
Quando passar algum ateu
Há-de curvar-se e tirar o chapéu
ao passar junto da criz...
Depois... só...
olhar... parar...
E quase contricto murmurar:
"Aqui morou Jesus!"

Maria Helena Amaro 
1957 

sábado, 11 de julho de 2015

Meditação


(Fotografia de António Sequeira)

Nunca estendas as mãos a procurar
na vida...
o que a vida a ti não pode dar...
Nunca queiras o que pertence ao sonho
e faz parte parte de ti...
Nunca sintas nos teus olhos parados
um impossível grande...
Nunca queiras saciar na noite
a sede de infinito...
........................................................................................
Estende os braços, os teus cansados braços
e lança-te à conquista...
O espaço é enorme... a clareira imensa
e as estrelas cintilam em candura...
E se achas...
Que a vida é dor, é agonia 
quer ao nascer ou ao findar do dia
É porque...
Ainda não tens um guia!

Maria Helena Amaro
1957

quarta-feira, 8 de julho de 2015

Refúgio


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Aqueles olhos verdes... aquele infindo mar
Aquele lago de águas cristalinas...
Prados imensos cobertos de boninas...
Seara fresca, à brisa a ondular...

Aqueles olhos verdes... quem diria?
Que Deus os fez tão verdes, tão iguais
Tão puros, tão divinos, tão reais
Onde se banham as musas d'alegria...

Agora aqui sozinha a meditar
A querer reter o que anda no ar
Na solidão destas brancas paredes...

Sonho... recordo... medito em profissão
E num sorriso de luz e emoção
Digo baixinho: "Aqueles olhos verdes..."

Maria Helena Amaro
Junho, 1954 

domingo, 5 de julho de 2015

Partir...


(Ilustração de Maria Helena Amaro)



As andorinhas andam nos beirais
à hora doce do entardecer...
Ó quem me dera partir e nunca mais
as escutar e nunca mais as ver...

Mas eu não posso partir sem um adeus
às doces aves que moram no meu ninho
E no azul escuro das nuvens dos Céus
ficaria só, perdida no caminho...

E se eu partir qual judeu errante
em busca dum Deus desconhecido
de Redenção, da Terra Prometida

Terei saudades do canto murmurante
das doces aves do seu gorgeio querido
Do teu olhar, a luz da minha vida!


Maria Helena Amaro
18/01/1956