Periodicidade de publicação de poemas

Caros leitores:
Espero que desfrutem na visita a este espaço literário. Este sítio virtual chama-se “Maria Mãe” e tem como página principal os poemas de Maria Helena Amaro.

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

A Lenda da Fiandeira


(Fotografia de António Sequeira)

Rosinha era filha daquele moleiro
daquele moinho à beira da estrada
Tinha na boca linda, um olhar feiticeiro
e um porte altivo de moura encantada
Era tão linda a Rosinha Modesta
tão simples e boa como a pobre giesta...

Tinha uns olhos negros, negros como o Céu
em noites de inverno que não têm fim
Tinha negras tranças, negras como o Céu
e a pele era branca, branca de jasmim
Quando ela sorria, sorria o luar
e os dentes eram jóias achadas no mar...

Mal o sol nascia no monte azulado
Rosinha era ave cantando no ninho
Sorria às flores, ao rio, ao prado
sentada a fiar à porta do moinho
E passava o dia sentada a fiar
ouvindo das aves o doce cantar

E desde a aurora até o sol por
Rosinha fiava com  vida e ardor
cantando à noite como o rouxinol
canções meritosas de sonho e amor
E Rosinha sonhava enquanto dobava
as estrigas de linho que ela fiava

O pai era um velho de olhar bondoso
um pobre moleiro que não maquiava
Para toda a gente era caridoso
Pobre lhe pedia e rico lhe dava
Vivia feliz com sua Rosinha
O anjo bendito que do Céu lhe vinha

Mas um dia na aldeia os sinos tocaram
Tocaram um toque, cheio de saudade
Morreu a Rosinha! Amores a mataram!
Da morte só Deus sabia a verdade...
Passado algum tempo o sino tangia
Era o pai da Rosa que também morria!

E no cemitério cheio de ciprestes
foram enterrar os dois lado a lado
Foram-se as estrigas, os cantos celestes
Ficou o moinho deserto e parado...
E nunca mais se viu Rosinha a fiar
sentada sozinha à porta do lar...

Maria Helena Amaro
13/10/1954

quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Suavidade


(Fotografia de António Sequeira)

Deixa-me pousar no teu regaço docemente
a minha cabeça cansada de pensar
Descansar na tua a minha mão ardente
e os meus olhos no teu cinzento olhar

Desça do céu um querubim divino
de asas brancas, puras, vaporosas,
para embalar-me num celeste fim
e entre perfumes de desmaiadas rosas...

Deixa esquecer-me que existe a vida
deixa partir-me como vela perdida
arrastada pelo mar que à praia vem
E no teu regaço, o meu altar de amor,
hei-de esquecer-me da minha imensa dor
e murmurar baixinho - "Minha Mãe!"

Maria Helena Amaro
16/05/1955




domingo, 13 de setembro de 2015

Encontro


(Fotografia de António Sequeira)

Tinha as minhas mãos e nelas tinha o nada
que te podia dar...
Tinha os meus olhos e não tinha luz
para te procurar...
Tinha os meus lábios e não tinha voz
para por ti chamar...
Tinha os meus pés e não tinha força
para caminhar...
Tinha a minha alma e não tinha afeição
para te consagrar...
Tinha um coração e não tinha amor
para te ofertar...
Tinha apenas na alma sonho louco
que me distanciava de ti pouco a pouco...
Tinha de noite a lua como guia
e não podia partir...
Tinha as estrelas como companheiras
e não as conhecia...
Tinha tudo para viver em ti
mas era um não na vida...
E foi então que descendo da dessa cruz
sorriste, estendeste-me os braços
e... vieste para mim
Senhor!
Para em mim ficares para toda a vida!

Maria Helena Amaro
Março, 1955 

domingo, 6 de setembro de 2015

Noite


(Fotografia de António Sequeira)

Ó noite, não cubras os meus olhos
Dá-me a luz, a luz... Dá-me o luar!
Da escura vim eu... irei voltar?
No meu regresso só levarei abrolhos...

De rasgar meus véus estou cansada
de procurar na noite me perdi
Vai-te embora, noite, vai daqui  
Dá-me o luar, a lua prateada...

Que importa o sol surgir no amanhã
Que importa a aurora ser coisa tão vã
Que importa a dor que a riqueza espezinha?
Deixa-me ver a minha alma ao luar
Porque somente na lua hei-de reinar
Eu que já de noite fui rainha...

Maria Helena Amaro
1958

sábado, 5 de setembro de 2015

Poeira do Caminho


(Fotografia de António Sequeira)

Poeira do caminho...
Poeira branca que o sol dourou
numa tarde de estio amena e quente...
Poeira do caminho...
Feita de lama, de espinhos, de fome
Perdida nas estradas
que vão até Além...
Poeira do caminho
Poeira humana, estéril, ardente, seca
como lábios de faunos
nos bosques escondidos...

Poeira do caminho
que beija rostos humanos tisnados
Tranças, loiras, negras, ciganais
Enfeitadas de goivos em flor
ou de mimosas lavres...
Poeira do caminho...
Braços erguidos aos céus em desespero,
bocas secas, rostos denegridos
Olhos perdidos no distante além
O meu além de dor...
... ... ... ... ... ... ... ...    
Serás poeira, Amor?
Poeira do caminho
que vai até Além? ...

Maria Helena Amaro
15/04/1957

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

A estrela da vida


(Fotografia de António Sequeira)
Eu vi uma estrela!
A estrela era linda, esfuziante...
E no céu azul
cintilava rutilante...

Eu vi uma estrela!
(Seria uma estrela?)
Que vaidosa era a estrelinha
de rendas enfeitadas
com vestes de luar...

E nos cabelos loiros cor de trigo
uma coroa trazia.
Coberta de pedrinhas...
- (Brilham tanto as pedras do caminho!?)
de estranha magia...

Eu vi uma estrela!
E como era bela!

A estrela sorriu, sorriu, desceu
por entre a noite escura...
- (Onde ia a estrela da vida
no céu azul perdida
enfeitada de sonho?)

A estrela desceu, desceu
e sobre mi pousou...
Eu tive uma estrela...
E tão escura sou!!!

Senhor? A minha estrela?
Que encontrei no céu?
Minha estrela perdi...
A Estrela morreu...

Eu vi uma estrela...
Eu tive uma estrela
E eu matei a estrela
que me enviou o Céu!

Maria Helena Amaro 
15/11/1957