Periodicidade de publicação de poemas

Caros leitores:
Espero que desfrutem na visita a este espaço literário. Este sítio virtual chama-se “Maria Mãe” e tem como página principal os poemas de Maria Helena Amaro.

domingo, 29 de dezembro de 2013

Pausa




















(Ilustração de Maria Helena Amaro) 


Por onde andam os beijos que me deste
por que caminhos os deixei fugir
palavras são silêncios (mudo agreste)
caminhos, gestos secos, sem sorrir...

Por onde andam os sonhos que teceste
de mão dada na bruma do porvir...
Desencanto sem nome... Será teste
à minha força, ao meu ser, ao meu sentir?

Busco os teus olhos... O que deles fizeste?
Busco o teu gesto... Ternura, onde a meteste?
Busco o teu ombro... Como vais reagir?

Se fosse morta... Que pensamento este!
Talvez meu corpo fosse estrela celeste
que tu passasses no Céu a perseguir...


Maria Helena Amaro
1992
Prémio Camões - participação feminina, Sociedade Portuguesa de Autores, 1993

sábado, 28 de dezembro de 2013

Boda


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Também eu casei num sábado de calor
Também eu fui de branco imaculado.
Vestida de princesa rendilhado
entre risos e falas de louvor...

Também eu recebi as promessas de Amor
junto ao altar e rosas enfeitado
grinalda de rendas, rosto emoldurado
e prometi ser fiel de ventura e de frescor...

Também eu recebi com Fé e em fervor
as graças concedidas a esse novo estado
e prometi ser fiel ao homem meu Senhor...

Também eu recebi num abraço apertado
O corpo de outro corpo misto de gozo e dor
Também eu fui a noiva dum noivo muito amado...

Maria Helena Amaro
julho, 1991

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Natal





















(Fotografia de António Sequeira)


Que trazemos ao Menino
nestas folhas deitadinho...
Trazemos das nossas almas
o mais profundo carinho...

Menino Jesus
nas palhas deitado
de oiro vestido
sorri animado...

Senhora do Céu
a mãe de Jesus
embala o menino
com risos de luz

S. José escuta
os anjos dos Céus
Bendiz o seu filho
que é filho de Deus!

E nós lhe rezamos
com alma e calor
Menino Jesus
Sêde o nosso Amor!

Cantemos com alegria
à volta desta lapinha
Menino Jesus é Rei
Nossa Senhora Rainha.

Nós somos pobres pastores
vindos de terras estranhas
Trazemos nas nossas bolsas
Vinho, azeitonas, castanhas....

Pouco temos para dar
além do nosso carinho
mandai-nos a vossa Estrela
a guiar  nosso caminho.


Maria Helena Amaro
Natal, 1980

domingo, 22 de dezembro de 2013

Opção


(Ilustração de Maria Helena Amaro)



Nos momentos graves desta vida
tomaste sempre a opção mais acertada
nem sempre a mais serena e ponderada
por seres mais singela e distraída...

Tomaste do Amor a parte mais sentida
e com ele a mais ignorada
consciente da dura caminhada
que encetaste feliz e assumida...

Vejo-te agora de face retorcida
entre o sonho, a dor desencantada...
a alma em fogo, na luta dividida...

Aos que passam por ti, não dizes nada.
Onde está a opção? Rota perdida!
Quem se perdeu e nunca foi achada?


Maria Helena Amaro
Julho, 1991


sábado, 21 de dezembro de 2013

Requiem





















(Ilustração de Maria Helena Amaro)


Acabou.
Morreu o Amor.
Agora
é só despedida.
E descobrir
que estás apenas, por favor
na sua vida.

Ainda recordas o dia em que isso foi?
Não queiras recordar
que isso dói.
É dor intensa sem cor e 
sem medida.

Acabou.
É hora da saída.

Mas tu não sais...
Tu ficas serenamente
a construir de novo
um ninho feito esperança
na curva do regaço.

Tu vais ficar...
Tu vais compor uma nova canção
e na dança rotineira desta vida
vais inventar, talvez,
um novo passo...

Fica.
Nem tudo é desencontro,
desalento,
cansaço.
Nem tudo se perdeu.
Depois da tempestade.
Talvez ressurja um punhado de Sol
numa nesga de céu!


Maria Helena Amaro
Concurso «Jogos Florais» da Casa do Professor
1991
1.º Prémio Poesia Lírica 

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Encontro de Natal


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Fui pescador sem cana
e sem anzol...
Fui trovador de rua,
quis cantar ao Sol...
Cantei à Lua!

Fui peregrino sem capa
e sem caminho...
Judeu pobre e errante
a mendigar carinho,
suplicante...

Fui pregador de lendas
de poemas
de promessas
de risos
de estradas de luz...

Procurei verdade
paz e bem...
Só encontrei refúgio
na gruta de Belém
junto a Jesus!

Maria Helena Amaro
Natal, 2013

domingo, 15 de dezembro de 2013

Solidão




















(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Aqui

é o quarto escuro
onde a solidão me mete de castigo
quando o meu coração se porta mal
e vai janela fora questionar...

Aqui

é que eu encontro o meu ego fechado
a minha sombra em meandros talhada
a minha porta verde
persiana corrida
mansão deserta
de goivos enfeitada...

Aqui

ninguém vem perguntar porque chorei
ninguém vem dizer porque menti
ninguém vem perguntar porque parei...

Aqui

é o quarto escuro
onde a solidão me mete de castigo
quando pergunto à vida o meu sinal
e a Deus o eco de outros passos...

Aqui 

sou eu
perdidamente Helena
ou Helena perdida
a que ninguém conhece...
Aqui
lápis, caneta, papel, livro,
paleta,
apaixonadamente
no silêncio do meu quarto escuro
renasço para a vida:
Sou poeta!


Maria Helena Amaro
Março, 1991

sábado, 14 de dezembro de 2013

Diálogo


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Atiraste um sorriso,
disseste uma palavra,
mas a palavra perdeu-se no ar,
porque eu não a prendi...
Ficou só o silêncio,
povoado de sorrisos vagos,
de gestos estudados,
de frases meias feitas...
Como é difícil dizer
dialogar
como é custoso distribuir
sorrisos
e não perder as palavras sinceras
que se perdem no ar...
Atiraste um sorriso
como quem quer falar.
O meu silêncio foi a pedra de toque:
convidou-te a calar.

Maria Helena Amaro
Março, 1991

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Presente





















(Ilustração de Maria Helena Amaro) 



Quero dizer
que o meu presente é feito de
passado
e que o futuro tem
já sinais de presente.
Morreram sonhos
mas os fantasmas deles
vêm visitar-te pela noite fora
e ficam comigo
numa agonia lenta.
O meu presente
é feito de fantasmas.
Fantasmas que não morrem
que não passam
porque querem povoar o meu futuro
e o meu futuro é feito do presente.


Maria Helena Amaro
Março, 1991.

domingo, 8 de dezembro de 2013

Recado


(Ilustração de Maria Helena Amaro)


Vou ao teu encontro
com a alma cheia de lágrimas
mas tu não vês...

Caminho para ti
com as mãos cheias de promessas
mas tu não vês...

Ocupo a tua estrada
com os olhos cheios de paixão
mas tu não sentes...

Bato a tua porta
chamo em alta voz
mas tu estás sempre ausente

Puseste cadeados nos portões
e grades nas janelas...
Que me importa chamar
a toda a hora...
e gritar um nome ou um sinal?
Ninguém ouviu falar...
Ninguém sabe de ti...
Tu não vais responder.
Perdi.

Maria Helena Amaro
Março, 1991

sábado, 7 de dezembro de 2013

Ofertório





















(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Nós vos trazemos Senhor
a nossa Fé
luminosa e ardente
como a chama que vai incendiar
estas velas singelas...
Aceitai-a Senhor
e fazei das nossas almas
fogueiras muito belas.

Nós vos trazemos Senhor

o pão caseiro
e os frutos da terra
que no altar irão
levar canseiras
alegrias e dores...
Aceitai-as Senhor
aceitai tudo...
Os cuidados sem fim dos nossos pais
o trabalho dos nossos professores
e o nosso estudo...

Nós vos trazemos Senhor

o cálice que guardará o vosso Sangue
e as hóstias que serão nosso alimento.

Aceitai-as Senhor

nisso pusemos
a nossa vida
o nosso mundo
o nosso tempo...

Nós vos trazemos Senhor

nas nossas mãos cheias de ternura
um livro e um brinquedo...
Aceitai-as Senhor
Sede o nosso mestre na cultura
Sede o nosso guia no folguedo.

Nós vos trazemos nas nossas mãos pequenas

as renúncias que fizemos cada dia
aceitai-as senhor
em nome das crianças  que trabalham no mundo
por um pouco de pão e nenhuma alegria...

Nós vos trazemos Senhor

as flores crescidas por vontade
do Pai que está no Céu...

Aceitai-as Senhor

nós queremos ser puros como elas
crescer em graça e luz
no jardim da bondade...

Aceitai tudo Senhor

É o que temos...
em alegria e dor
É o nosso Amor!


Maria Helena Amaro
Páscoa, 1991

quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Vermelho


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Chama-se raiva o meu amor
chama-se raiva ...
Chama-se raiva e ninguém vai aportar...
Chama-se raiva, o meu amor
chama-se raiva
chama-se raiva e ninguém vai parar...

Chama-se Dor, o meu amor
chama-se Dor
chama-se dor e ninguém vai chorar

Chama-se desencanto o
meu Amor
chama-se desencanto e
ninguém vai falar...

Chama-se fuga o meu amor
chama-se fuga
chama-se fuga e
ninguém vai chamar...

Chama-se Sonho o meu amor
chama-se sonho
chama-se sonho
e ninguém vai cantar...
Raiva
Desencanto
Dor
Fuga
Sonho
é o conjunto do meu
viver sereno
estagnado e pobre
como um lago de
cisnes
que foram metralhados...

Maria Helena Amaro
Foz de Arouce, agosto de 1990

domingo, 1 de dezembro de 2013

Momentos



















(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Estás tão só
e tens tanta pessoa
à tua volta...
Gostas das pedras
das areias, dos fetos...
Chamas de nome
às silvas calcinadas
e até as cobras vêm dançar para ti!

Ser primeiríssimo

do primeiro mundo
não sei com quem conversas
tantas vezes
nem sei o nome da tua solidão...

Vens de outro mundo

que não é teu...
Procuras outro ser que conheces
ensaias linguagem
que ignoras...
Ninguém sabe da tua solidão...
Ninguém conhece o teu perfil talhado.
Ninguém encontras, nem ninguém procuras...

Mas a Esperança

vai andar na rua
e na próxima esquina
da cidade
tu vais encontrar o som cadente
da viola encantada...


Maria Helena Amaro
Foz de Arouce
Agosto, 1990