Periodicidade de publicação de poemas

Caros leitores:
Espero que desfrutem na visita a este espaço literário. Este sítio virtual chama-se “Maria Mãe” e tem como página principal os poemas de Maria Helena Amaro.

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Crianças (1957)


(Fotografia de António Sequeira)

Eram crianças
de camisas rasgadas
calças esburacadas
descalças sobre a lama...

São lembranças
lembranças de crianças
que vivem nas lembranças
de quem as quis e ama

Perduram nas lembranças
lembranças que não cansam
e preenchem a alma...

Eram crianças...
Hoje não há crianças
há apenas lembranças
que a saudade acalma.

Maria Helena Amaro
Abril, 2014 

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

Finados - «Janeiro 1964»


(Fotografia de António Sequeira)

Era o tempo da esperança, da certeza,
da luminosa ideia de ser mãe,
do sonho mesclado, dor, também,
uma imensa planície de beleza.

Um sonho feito caiu no meio seio,
palpitante e vivo como o mar.
Já o sentia em mim a saltitar.
Tão grande era a espera e o anseio.

Não me perguntem porque o susto veio,
na madrugada que eu ainda odeio
em que o meu filho nasceu sem esperar...

Veio e partiu... morreu o meu enleio...
O pesadelo ficou... medonho e feio...
Tão doloroso! Dolorosa a recordar!

Maria Helena Amaro
Novembro, 2013. 

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

Corri


(Fotografia de António Sequeira)

Corri atrás de sonhos deslumbrada
a construir castelos animada,
mas ruíram todos feitos pó.
Nas mãos estreitas não restava nada.
Na minha alma há luzes de alvorada.
Faço poemas e não me sinto só.

Maria Helena Amaro
14 de maio de 2014.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

Não vás por aí


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Não vás por aí
não queiras procurar
razão para chorar
gritar e maldizer...

A vida é toda isto
e se a ela resisto
é porque em mim insisto
e vou sobreviver...

Maria Helena Amaro
2014

terça-feira, 17 de janeiro de 2017

Poesia


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Ando à procura
de uma forma gentil
de colocar a poesia
em tudo o que escrevo...
Palavras são palavras,
ideias são ideias...
O sonho é meu enlevo...

Maria Helena Amaro
Março de 2014

domingo, 15 de janeiro de 2017

Novembro


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Encheu-se a rua de raios de luar
como noiva enfeitada de rendas...
A lua cheia tudo vai iluminar:
medonhas sombras em escuras sendas.

Novembro chegou para ficar.
Mês dos votos, das preces, das oferendas,
dos mitos, dos costumes e das lendas,
dos mendigos a pedir e a rezar...

Mês de novembro é o mês dos Santos,
dos mortos, dos vivos e dos prantos,
das liturgias e do sino a tocar.

A lua cheia ilumina os teus recantos,
mas a amargura que trazes nos teus cantos,
só Deus, só Deus a pode sufragar.

Maria Helena Amaro
Novembro, 2013.


sábado, 14 de janeiro de 2017

A minha poesia


(Ilustração de Maria Helena Amaro) 

Sei que a minha poesia é imperfeita,
cheia de afirmações, tão pouco exatas,
de ideias utópicas, abstratas,
que sempre escrevo com uma rima eleita.

Sei que a minha poesia é ideário,
de quem vive a vida aos solavancos,
coisas tão velhas metidas num armário.

Sei que a minha poesia não vai longe,
aqui nasce, ali morre esfarrapada,
escrita sem luz e logo abandonada...

Poesia de uma alma feita monge
que enfeita de sol a sua estrada,
mas espera da vida tudo... ou nada!

Maria Helena Amaro
Novembro, 2013

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Loas ao Sol


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Eu sei quem é o Sol... Eu sei que ele há de vir...
Depois da noite surge a madrugada.
A rua vai acordar toda lavada,
cheia de luz, de risos, a sorrir...

Eu sei que o Sol é vida e é calor
é alvorada, e é anoitecer...
É a força do homem pr'a viver,
é chama, é fogo e é amor.

O Sol, chamam-lhe Deus e é Senhor,
Senhor da nossa vida enregelada,
Senhor da nossa alma a envelhecer...

Chora connosco à hora de sol-pôr...
Enche de luz a nossa caminhada...
Não morre nunca... pois é senhor do ser.

Maria Helena Amaro
12 de novembro de 2013



  

segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

A chuva na cidade


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Cai a chuva lenta, docemente,
sobre a cidade de cinzento vestida.
Estão vazios os bancos da avenida,
sem crianças, sem velhos, tristemente.

Os dias são escuros, ocos, frios,
os rostos das pessoas são tristezas.
Não há risos, simpatias, gentilezas...
A cidade sobrevive em arrepios...

O outono na cidade é aguarelas.
Não há roupas penduradas nas janelas...
Nem corridas, nem passeios, nem baloiço...

O bairro é alcatifa de folhas amarelas.
Andam vultos sem nome nas vielas...
A chuva cai... São lamentos que oiço.

Maria Helena Amaro
Novembro, 2013

domingo, 8 de janeiro de 2017

Outono


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Tão longa esta distância, neste outono de breu.
Tão grande a solidão sem ombro e sem amparo.
Desejo de ternura que já me sai tão caro
que vou perdendo aos poucos o tudo que era meu.

Recordo na distância todo sorriso teu.
Procuro com loucura, num jeito tão avaro,
o pouco que restou de um sonho lindo, raro,
que foi o nosso amor, que tão cedo morreu.

Lá vou a tropeçar de alma toda ao léu.
À tua procura: nenhum sinal  do céu,
que me indique na terra um caminho claro.

Mas neste outono escuro como o breu
sou como a folha que a chuva desprendeu
e cai no chão que a recebe avaro.

Maria Helena Amaro
Braga, 3 de novembro de 2013

sábado, 7 de janeiro de 2017

Finados - «Julho 1966»


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Morria a minha filha, antes de ter nascido...
Eu perguntava a Deus: «O que fizeste dela?»
Morria a minha filha! Fechava-se a janela.
De tanta esperança bela que eu tinha vivido.

Fechou-se no meu ventre, sem a ter conhecido...
Sem a ter embalado numa canção singela...
Momento de dilúvio, tempestade, procela...
Agonia de morte sem gritos, sem gemido.

Verónica Maria era o nome escolhido
em silêncio de paz e amor tão sentido,
que esse nosso amor, era amor sem querela.

Em troca desse amor, que dei ao meu marido?
Agonia, tristeza, tanto sonho perdido.
Eu perguntava a Deus: «O que fizeste dela?» 

Maria Helena Amaro
Braga, 1/11/2013

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

Folha perdida


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Um véu cinzento desce sobre mim,
tão cinzento que a alma me consome...
Ando à procura de lhe dar nome...
Não é anjo, nem arcanjo, nem querubim.

Enche-me a alma de agonia, de incerteza,
cobre-me toda de angústia, tão forte...
Destino mau? Desencanto? Má sorte?
Estrada longa de inércia, de tristeza...

Abro os olhos... Fecho os olhos... É cinzento,
o que vejo, o que sinto, neste tempo,
nesta alvorada, sem luz, descolorida...

Onde vou eu embrulhada neste véu?
Nada sou, nada tenho, nada é meu...
Quem sou eu? Quem sou? Folha perdida!

Maria Helena Amaro
Outubro, 2013 


terça-feira, 3 de janeiro de 2017

A chuva


(Ilustração de Maria Helena Amaro)

Tão depressa se vai a madrugada
para que o sol ridente
ilumine a estrada
e a alma da gente...
Mas a chuva teima 
em se mostrar
serena, persistente,
a cair, a molhar...
Tão depressa é fria e fustigante
a penetrar nas ruelas desertas
tão negra e descuidada
como a capa pendente de estudante.
Enche a cidade de água.
Os corpos de humidade.
E a avenida é toda rios, mágoa,
sarjeta de revolta e de saudade.

Maria Helena Amaro
Braga, outubro de 2013. 

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

A cidade


(Fotografia de António Sequeira)

Vou na cidade vestida de cinzento,
pois de cinzento se veste esta cidade.
Cidade velha, cansada, sem idade,
com gente nova, agreste, em movimento.

Vou pelas ruas e canto o desalento,
o desemprego e a mendicidade...
E o aparato de tanta mocidade,
entontecida, correndo atrás do vento...

Eles correm contra o curso, em espavento
como se a vida não tivesse tempo,
como se o curso fosse eternidade.

Vou na cidade vestida de cinzento.
Acho tão triste este meu passatempo
que me recolho toldada de saudade.

Maria Helena Amaro
Outubro de 2013

domingo, 1 de janeiro de 2017

O teu olhar


(Fotografia de António Sequeira)

Tantas vezes me perdi no teu olhar...
Tantas vezes senti o teu afago...
Tantas vezes quis beber de um só trago
o teu amor tão longo como o mar.

Tantas vezes parei a meditar,
na noite escura da vida, o seu agravo.
E vinhas tu transformar o amargo
em risos doces que faziam sonhar...

Já não me perco no teu olhar tão vago...
E esta ausência que existe, que trago,
é pesadelo que não vai acabar...

Tantas vezes perguntei, sem embargo,
porque choro, porque canto, por que gravo
neste meu coração o teu olhar?

Maria Helena Amaro
26/09/2013